quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Um Conto de Natal

Foi quando André sentiu seu rosto molhar que ele percebeu o pavor percorrer pela espinha pela primeira vez.

Misturado ao baque da queda de André, era possível ouvir as risadas dos outros garotos, que apenas assistiam a cena. Ricardo, o líder, usava seu pé para pressionar a face de André contra a larga poça d'água no chão.

- Que trouxa!  - André ouviu um dos garotos.

- Fala de novo, Andrézinho! - pediu Ricardo com sarcasmo - Fala de novo, vai!

André não se mexeu, tampouco teve a vontade de abrir a boca para falar o que quer que fosse, ainda mais com sua boca voltada diretamente para a água da rua.

- Tá com vergonha agora, é?! - falou outra voz. André começou a se perguntar quantas pessoas estavam ali.

Mas não teve muito tempo para contar, pois o pé de Ricardo voltou a pressionar sua cabeça contra a poça, e dessa vez, Ricardo pressionou tão forte que as narinas de André adentraram completamente na água. Desesperado por ar, André abriu a boca, soltando um grito involuntário, que provavelmente estava preso há algum tempo.

Ricardo e os outros riram.

- Você não foi um bom menino! - zombou um dos garotos.

- Tá na hora de crescer, Andrezinho! Não dá mais pra ficar acreditando em Papai Noel, não! - falou Ricardo.

André mal podia acreditar que a surra que estava levando era por conta do maldito Papai Noel.

- Para Riqui! - chorou uma voz infantil e familiar para André.

- Arthur, sai daqui! - falou André pela primeira vez, recebendo um soco no estômago logo em seguida.

- Não é pra falar com meu irmão! - Ricardo não estava mais zombateiro como antes. Sua voz agora exalava raiva.

Talvez, de fato, o maior erro de André tenha sido falar com Arthur. Ponderando sobre isso, André não tinha nada que consolar Arthur. Não era da sua conta que o garoto estava chorando porque Ricardo lhe disse que Papai Noel não existia. Ainda assim, André pensou, porque isso chateara tanto Ricardo? Porque falar pra uma criança de oito anos que Papai Noel existe seria motivo para que Ricardo e seu grupo de amigos emboscassem André na volta da escola e levassem ele para trás do prédio?

- Repete agora pro Arthur! - ordenou Ricardo - Fala que Papai Noel existe!

André sentiu o rosto ruborizar. Mas agora não podia andar pra trás, não com Arthur assistindo.

- Papai Noel...existe!

As gargalhadas rasgaram o local. Ricardo retirou seu pé de cima do rosto de André e o puxou pelo colarinho.

- Você me fez perder a paciência! - anunciou Ricardo se preparando para um soco.

André cobriu o rosto com as mãos, esperando pelo pior. Mas tudo o que aconteceu, foi o som de um guizo.

- Quem tá ai? - perguntou Ricardo, ainda zangado.

- Ho...ho...ho...

Não era uma risada natalina, pensou André. Era uma ironia recheada de desprezo. E Ricardo notou também.

- Não tô com paciência! - anunciou o garoto - Aparece ou vai levar surra também!

Todos os olhos procuravam a origem, e então, sem mais nem menos, um vulto arrastou Ricardo de forma tão inesperada, que não deu tempo de ouvir nenhum grito, apenas o som de um guizo.

- Riqui! - gritou Arthur.

André, inconscientemente foi até o garotinho e o abraçou.

Os colegas de Ricardo olhavam para os lados amedrontados. Quando um deles quebrou o gelo do medo e fez menção de fugir, o vulto reapareceu, e com um guizo tocando, o outro garoto também desapareceu.

Um pânico generalizado se formou. Todos gritaram e saíram correndo por lados diferentes. André observou em choque cada um deles sendo arrastados, pelo vulto, o guizo tocando incessantemente, até que....silêncio. Não havia ninguém ali, apenas André e Arthur, que estava em seus braços, chorando.

André olhou para os lados, assustado. Tentava manter a respiração baixa, com medo de que fosse descoberto por sei lá o que.

De repente, um baque. Uma coisa pesada atingiu o chão. O susto fez com que os dois garotos gritassem, mas quando André olhou, percebeu um grande e enorme saco vermelho á sua frente.

- Fica aqui! - falou pra Arthur.

Pé ante pé, André se dirigiu até o saco vermelho.

Com medo e desconfiança, André abriu o saco.

Não houve grito. Não houve choro. O choque de ver Ricardo e seus amigos mortos e desmembrados dentro do grande saco vermelho deixou o menino paralisado.

Percebeu, então, do lado do saco, uma etiqueta, com as palavras escritas em sangue "Feliz Natal!".

O som guizo voltou a tocar, e foi se afastando gradativamente...









quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Uma manhã comum





De olhos fechados, ela percebia os raios da manhã adentrarem pelas frestas da janela. Não, ela pensou imediatamente. Precisava continuar em seu sonho. Remexeu-se a noite toda lutando contra aquele pesadelo, e agora que as coisas tinham se acalmado, precisava tentar por um final feliz nele.

Inútil, concluiu após se revirar na cama. Não teria como voltar.

Levantou-se da cama com o coração angustiado e sem exatamente se lembrar do motivo que a levou se sentir assim. Queria chorar e, quando se deu conta desse fato, foi o que fez.

Que bobagem, disse em voz alta para si mesma, enquanto limpava as lágrimas com a manga do seu pijama. Saiu da cama e ligou o chuveiro. Era hora de tirar esse sentimento ruim e infundado de dentro dela.

Mal sabia ela, que esse sentimento dificilmente seria deixado para trás.




sábado, 2 de junho de 2018

Mudança





Um dia, ela foi uma garota mágica
Inundada pelo seu próprio otimismo
Sentia a magia fluir pelo seu corpo
Sabia que era capaz de tudo

Mas o que a vida fez dela, não dá para saber
Um dia acordou, cansada, sem esperança
Pela primeira vez, temeu o futuro

Suas magia, sentia escorrer pelos dedos
Seu otimismo foi tomado pela insegurança
Tinha medo
Não sabia mais se era capaz

Respire, pensou
Mas esqueceu-se como o fazia
Sentiu o ar lhe abandonar
Temeu o futuro
Descobriu o que era ser adulto

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Apenas um segundo






Se eu pudesse, por apenas um segundo
Sair por ai, esquecendo quem eu sou
 Me desvencilhar de tudo
Sem me importar aonde vou

Se eu pudesse, apenas por um segundo
Deixar de ser eu mesma
Achar uma outra maneira
Pra fugir desse mundo

Eu queria poder chorar
Apenas por um segundo
Deixar a garganta vazar

E tirar a mágoa que mora ao fundo

quarta-feira, 24 de junho de 2015

A Menina Que Contava Histórias para a Lua.




Toda noite ela sentava na janela, deitava-se sobre seus braços e olhava para aquela forma naturalmente redonda e branca de luz fraca, mas que se intensificava na escuridão da noite.

Era sua única amiga.

Sua luz pálida e fria era confortante. Somente ela a entendia, somente ela a ouvia. E toda a noite, a menina contava-lhe suas histórias.

Contava baixinho, para não acordar as colegas. Mas não fazia diferença, pois ela sabia que mesmo baixinho, a Lua estaria ouvindo.

“Ela sempre estará ouvindo!” disse a si mesma, com um leve sorriso no rosto.

“Está frio esta noite, não é?!” começou a menina “Lua, hoje aconteceu uma coisa maravilhosa: eu fiz um amigo!”.

A Lua brilhou animada.

“Eu sei!” exclamou vendo a empolgação da amiga “Quem poderia imaginar, não é?! Quer que eu conte sobre ele?”.

Então ela subiu, para prestar atenção. A menina, feliz com a resposta, iniciou a sua história:

“Eu estava no pátio quando o vi. Estava sentada lá no canto da arquibancada, sabe?! Aquele onde sempre fico?!”.

A Lua assentiu.

“Então, eu estava lá e olhei pro chão, foi quando eu notei ele caído, com a perna machucada! Fui até ele e perguntei se estava bem e o que tinha acontecido, mas ele não me respondeu, porque estava com muita dor!”.

Uma das meninas, deitada na cama ao lado, mexeu-se. A menina, notando o movimento, deitou rapidamente em sua cama e a Lua diminuiu seu brilho. Esperaram escondidas. Quando o silêncio voltou, a menina retomou seu lugar na janela, bem devagarinho.

“Foi por pouco!” suspirou aliviada. A Lua concordou.

Ela olhou pros lado, e vendo que tudo estava bem novamente, tornou a contar a história.

“Onde eu estava? Ah sim! Ele estava muito machucado, então eu o levei aqui pro quarto!”.

A Lua piscou.

“Sim, sim, eu sei! Não poderia ter feito isso, mas não tinha outra escolha, não podia deixar ele lá!”.

“Trouxe ele e cuidei dos ferimentos! Ele dormiu a tarde toda, mas quando acordou, me agradeceu, e agora somos amigos!”. Finalizou sorrindo. “Ele até veio jantar comigo!”.

A Lua irradiou de felicidade.

“Quer conhece-lo?”. Perguntou a menina, apontando para algum lugar no quarto.

Então ela subiu de novo no céu.

A menina olhou pros lados, com cautela. O silêncio continuava. Ela se esgueirou pra debaixo da cama, e por um instante, a Lua a perdeu de vista. Quando ela apontou de novo na janela, trazia consigo uma pequena caixa.

“Improvisei essa casinha pra ele!” Explicou “Mas tem uma abertura, ele pode sair e voltar quando quiser!”.

A menina retirou uma pequena bola amarronzada e peluda da caixa. Era um camundongo.

“Ele não me disse o nome dele ainda, mas olha amiguinho...” Falou para o camundongo em suas mãos  “Essa é minha amiga Lua, e muito em breve, estarei com ela lá em cima!”.


A Lua brilhou, até mais do que havia brilhado aquela noite, feliz por conhecer um novo amigo. 

domingo, 30 de novembro de 2014

O Pintor





Olha ai, aquele moço passando
Com um sorriso gostoso
Com papéis de esboço
Com alegria no rosto

Olha lá, aquele moço pintando
Aquela paisagem conhecida
Aquela moça bonita
Aquela peça esquisita

Olha só, o moço indo embora
Já deu sua hora
Acena contente
Se despedindo da gente


Mágica





Sente-se, vou te contar um história
Antiga ou nova, não importa
Posso jurar que dela, você irá gostar
Então, recoste-se, pode deitar!

Agora abra a sua mente
E me deixe nela entrar
Você vai ver todas as mágicas que vou fazer
Milhões de maravilhas irão aparecer

Feche os olhos, pode sonhar
E acredite que tudo é real
É o poder que os sonhos têm
Boa noite, durma bem!

domingo, 23 de novembro de 2014

Quatro Estações






Era uma menina
E como todas as outras, sonhava
Sonhos que um dia esperava realizar
Como voar
Ou derrotar um dragão.

Era uma garota
E como todas as outras, esperava
Esperava o dia em que chegaria
O grande e único amor

Era apenas uma mulher
E como todas as outras, vivia
Vivia um dia após o outro
Tentando conciliar tudo o que havia conquistado

Era apenas uma velha
E como todas as outras, lembrava
Lembrava da época em que era menina
E sonhava em voar e derrotar dragões.

terça-feira, 18 de março de 2014

?





O que eu procuro não tem nome
Não tem forma, gosto ou cheiro
Mas eu tenho fome
De algo que nem sei direito

Eu procurei e cansei de não encontrar
Eu deixei pra lá e cansei de esperar
E agora?
Fico ou vou embora?

E se nunca aparecer?
Que devo fazer?

domingo, 2 de março de 2014

Tudo Bem





Andando pelas ruas escuras, tudo parece igual
O vento parado e nem as sombras parecem se mexer
Nada fora do normal
Tudo como se deve ser

E agora mesmo, eu sinto, posso partir
A necessidade que se fazia, já deixou de existir
É hora de embarcar

Quando o amanhã chegar, já estarei a mil léguas daqui
Não é como se alguém fosse se importar
Então, parto sem me despedir